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Responsabilidade penal de pessoas jurídicas no Brasil

A responsabilidade penal de pessoas jurídicas no Brasil é tema de longa controvérsia, marcada pela tradição do societas delinquere non potest, segundo a qual apenas pessoas físicas podem cometer crimes. A Constituição de 1988 rompeu parcialmente com essa lógica ao prever, no art. 225, 83°, a responsabilização penal de entes coletivos por crimes ambientais – exceção que, até hoje, permanece restrita a esse campo.
No plano infraconstitucional, a Lei n° 12.846/2013 (Lei Anticorrupção) representou avanço significativo ao prever sanções civis e administrativas para pessoas jurídicas que pratiquem atos lesivos contra a Administração Pública. Contudo, não há previsão legal de responsabilização penal para empresas ou partidos políticos por crimes como corrupção, peculato, fraude a licitações (arts. 337-E a 337-P do CP) ou lavagem de dinheiro (Lei n° 9.613/1998). Assim, a persecução criminal recai apenas sobre as pessoas físicas envolvidas.

No caso dos partidos políticos, o debate assume relevância especial. Dotados de personalidade jurídica e função essencial à democracia (art. 17 da CF), administram volumosos recursos oriundos do Fundo Partidário e do Fundo Especial de Financiamento de Campanha. Casos recentes envolvendo desvios, contratos superfaturados e uso de empresas de fachada reacenderam a discussão sobre a possibilidade de responsabilização penal dessas entidades, enquanto beneficiárias diretas de condutas ilícitas.
A corrente favorável à ampliação sustenta que, tal como ocorre nos crimes ambientais, a responsabilização penal de entes coletivos em ilícitos contra a Administração Pública não violaria a Constituição, desde que houvesse previsão legal clara e respeito aos princípios da legalidade (art. 5°, XXXIX, CF) e da culpabilidade. Já os críticos alertam para riscos à pluralidade democrática e para a possibilidade de uso político do Direito Penal (lawfare) como forma de inviabilizar ou extinguir legendas adversárias.

A jurisprudência do STF e do ST] mantém posição restritiva, limitando a responsabilidade penal de pessoas jurídicas às hipóteses ambientais. Contudo, a pressão social por maior efetividade no combate à corrupção e a experiência de investigações envolvendo partidos e empresas contratadas pelo poder público têm impulsionado propostas legislativas e estudos acadêmicos favoráveis à ampliação do modelo.

O desafio é construir um sistema que una efetividade na repressão à criminalidade institucional e respeito às garantias constitucionais, o que exige:
a) Previsão legal expressa e delimitada das hipóteses de responsabilização coletiva;
b) Critérios objetivos que vinculem a conduta ao interesse ou benefício institucional;
c) Sanções proporcionais, sem comprometer indevidamente a representação política; e
d) Implementação obrigatória de programas de integridade e auditorias independentes.
Em um cenário de crescente demanda social por probidade administrativa, discutir a responsabilidade penal de partidos políticos e pessoas jurídicas por crimes contra a Administração Pública é passo necessário para avaliar se o Direito Penal brasileiro está preparado para enfrentar a corrupção sistêmica com rigor, sem abrir espaço para arbitrariedades ou fragilização da democracia.

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