Há relatos que nos atravessam como um grito. Tivemos no início deste ano, em uma cidade litorânea do Rio Grande do Sul, uma menina de apenas nove anos, que viveu o inimaginável. Subitamente desaparecida, foi encontrada horas depois, escondida em um espaço minúsculo, escuro e cruel, improvisado nos fundos de um estabelecimento comercial. Uma armadilha montada com a intenção explícita de ferir. Seu resgate, feito com bravura pela Brigada Militar, foi um alívio para todo um estado que acompanhava, com o coração apertado, o desenrolar das buscas.
O caso é extremo — mas não é isolado. Situações como essa evidenciam uma verdade dolorosa: nenhuma criança está totalmente segura sem a vigilância dos adultos que a cercam. E aqui falamos de um compromisso que vai além do núcleo familiar. É dever de toda a sociedade, pais, escola, comunidade, Estado, garantir que nossas crianças possam crescer com segurança, dignidade e afeto.
Vivemos em uma época em que a ingenuidade infantil convive, perigosamente, com a maldade adulta. Pequenos descuidos podem se tornar tragédias. Por isso, proteger não é paranoia, é cuidado, é responsabilidade, é amor. Ensinar sobre os perigos do mundo sem roubar a inocência é um dos maiores desafios da parentalidade e da educação.
E os perigos não estão apenas nas ruas. Na era digital, a ameaça também habita em telas. Aplicativos, redes sociais e jogos online — por mais inofensivos que pareçam — podem abrir portas para contatos perigosos, assédio, exposição indevida e traumas duradouros. Nesse ambiente, o controle dos pais ou responsáveis é urgente.
Não se trata de vigiar com desconfiança, mas de construir um diálogo constante e franco, onde a criança saiba que pode contar com seus adultos de referência, onde se sintam seguras para dizer “isso me deixou desconfortável” ou “aconteceu algo estranho”.
A violência contra crianças não fere apenas o corpo, ela marca a alma. Crianças que passam por episódios de abuso ou violação de sua integridade física e emocional, quando não recebem o suporte adequado, carregam cicatrizes para toda a vida. O acompanhamento psicológico e o acolhimento amoroso podem ser o que define um futuro de reconstrução ou de dor contínua.
Por isso, enquanto ex-conselheiro Tutelar, vereador da capital e presidente da Frente Parlamentar da Criança e do Adolescente, tanto na Câmara Municipal quanto, hoje, na Assembleia Legislativa, sigo carregando essa bandeira com a convicção de que a proteção da infância é um pacto que precisa ser firmado todos os dias por toda a sociedade.
Não podemos aceitar que esse tipo de crueldade siga acontecendo. É urgente que nos envolvamos. Que não viremos o rosto. Que sejamos os olhos, os braços, os ouvidos atentos de uma infância que ainda confia em nós. Que ainda acredita que o mundo é um lugar seguro. Que ainda acredita nos adultos.