Recentemente, o presidente da OAB/RS, Leonardo Lamachia, foi entrevistado pelo apresentador do Pampa Debates, Paulo Sérgio Pinto. A Revista Em Evidência, gentilmente, compilou os melhores momentos dessa conversa, onde o Lamachia pontuou sobre as principais questões pertinentes à Ordem gaúcha. Ele abordou também sobre algumas pautas nacionais, como a atuação do Supremo Tribunal Federal e a criação do Plenário Virtual. Confira a seguir, alguns trechos desta entrevista, em mais uma parceria da Rede Pampa com a Revista Em Evidência.
Como o presidente da OAB/RS enxerga a agenda da própria entidade atualmente?
Uma OAB/RS muito atuante e ativa, se manifestando sobre todos os temas que sejam de interesse da advocacia e da sociedade. Repetimos o maior evento da nossa história, fizemos a Cidade da Advocacia maior ainda. Foram 40.000 inscritos em três edições, um evento absolutamente gratuito e democrático, no Cais Embarcadero. Nós escancaramos as portas da instituição para as advogadas e advogados gaúchos, não só de Porto Alegre, porque muitos vieram do interior. Repetiremos as posses e continuaremos lançando programas estruturantes para nichos específicos, como a mulher advogada e a jovem advocacia. Nós queremos cuidar também da advocacia 60+. Já temos um programa estruturado para os advogados que possuem dificuldade com as novas tecnologias. Nós vamos fazer uma defesa vigorosa das prerrogativas de advogadas e advogados. Continuaremos com a nossa luta pelo direito da sustentação oral. Também, realizaremos audiências públicas. Enfim, atuando da forma mais dinâmica possível para expandir o espectro de atendimento sem deixar jamais de atender as demandas de qualquer um dos nossos filiados.
Qual a sua opinião sobre o Plenário Virtual?
É importante tocar nesse ponto, inclusive criamos uma campanha em que vídeo gravado não é sustentação oral. O Supremo Tribunal Federal criou uma figura chamada Plenário Virtual, onde o julgamento não é em tempo real. Por exemplo, ele abre no dia 10 e termina no dia 13. Ao longo desse período, os ministros ou desembargadores vão lançando seus votos ali. Só que isso não é acompanhado nem pela advocacia ou pela parte, o que não nos oportuniza o direito de sustentação oral. Para tentar compensar essa perda, nós devemos enviar um vídeo gravado. Por isso, que realizamos esta campanha, pois vídeo gravado não é sustentação oral e nunca vai ser. Primeiro, porque não é assistido e nós temos provas disso. Existem colegas que mandaram o vídeo gravado e depois de realizado o julgamento lá no link tinha zero visualizações. Além disso, nesta situação não podemos fazer uma questão de ordem e acompanhar o debate entre os julgadores. O direito à sustentação oral é fundamental para a defesa dos interesses da sociedade em juízo. Nós fomos a Brasília, temos uma Proposta de Emenda à Constituição que está tramitando no Congresso Nacional, para garantir o direito de sustentação oral em qualquer tribunal e instância. Infelizmente, no final do ano passado, tivemos uma decisão do Conselho Nacional de Justiça que ratificou esta ferramenta chamada Plenário Virtual. Nós defendemos o presencial e o telepresencial, mas desde que seja ao vivo. Então, nós vamos continuar lutando e eu acredito que conseguiremos reverter esta decisão e manteremos o direito à sustentação oral.
Como o senhor avalia a relação do Supremo Tribunal Federal com o Parlamento?
Eu tenho externado preocupação em relação a algumas iniciativas do Supremo Tribunal Federal. Refiro-me, especificamente, ao Inquérito 4781, batizado de “Inquérito do Fim do Mundo”, que viola o devido processo legal e, portanto, também atenta contra a democracia. Existe um desarranjo institucional em determinados momentos. A Constituição diz que os Poderes são harmônicos entre si, portanto, eles podem ter posicionamentos e pontos de vistas distintos, mas precisam ser independentes. A independência, com algumas decisões do Supremo, está sendo afetada. Segundo Rui Barbosa, a pior ditadura é a do Poder Judiciário, porque contra ela não há a quem recorrer. Eu acho que vivemos um momento gravíssimo de decisões partindo da Suprema Corte, que é o farol do Poder Judiciário brasileiro, violando o devido processo legal e as prerrogativas da advocacia. Isso tem que mudar imediatamente. Quando nós vemos ministros do Supremo dando entrevistas sobre processos e indo para dentro do Congresso Nacional debater temas que estão sendo objeto de enfrentamento no Parlamento, isso é um descumpri mento à Lei Orgânica da Magistratura. Eu me lembro de outro aspecto desse desarranjo institucional. O Supremo tem algumas decisões monocráticas, onde um ministro com uma decisão liminar e monocrática, suspendeu os efeitos de uma lei que foi votada no Parlamento. Não devemos esquecer que o Parlamento criou uma emenda à Constituição para reduzir o número de decisões monocráticas. O Supremo reage com algumas questões que estão em julgamento. Esse não é o modelo que precisamos para uma democracia. Então, eu pretendo fazer um debate técnico sobre a composição do Supremo Tribunal Federal. Se nós continuarmos tendo a sistemática de nomeação dos ministros por presidentes da República, nós continuaremos com essa dicotomia entre a direita e a esquerda. A OAB/RS está pronta para fazer esse debate de forma técnica, isenta, longe das torcidas e das paixões ideológicas, porque esse é o nosso papel.
Como foi ser reeleito presidente da OAB/RS, com tamanha aceitação?
De fato, fiquei muito feliz com o retorno que a advocacia nos deu, foi a maior eleição da história da OAB/RS, com 77% dos votos. Nós tivemos vitória em todas as 107 subseções. Isso não acontecia há muitos anos e demonstrou que esta votação expressiva, validou o trabalho de três anos que fizemos. Nos dá muita legitimidade para continuarmos as nossas lutas. Então, me orgulho muito do nosso trabalho, que é coletivo. Todos nós recebemos essa aprovação maciça, garantindo muita legitimidade e, claro, nos impondo também muita responsabilidade, porque há uma expectativa de que possamos fazer grandes entregas e conquistas. No início da gestão anterior, eu estive nas posses dos nossos 107 presidentes. Foi uma cruzada inédita. Eu andei 80.000 quilômetros em sete meses, praticamente. Nesta gestão, novamente darei posse para os nossos presidentes, porque esse é um momento muito importante, onde nós reafirmamos nossos propósitos e valores.
Se queres bem viver, contrate um advogado. O senhor é a favor ou contra essa judicialização toda?
Eu acho que nós estamos vivendo a década da maior judicialização. Nós precisamos encontrar mecanismos para que o Poder Judiciário dê respostas mais rápidas. Nós temos ainda uma morosidade na Justiça. São muitos os fatores responsáveis, como o número de Faculdades de Direito, pois existem 1.900 cursos e muitos deles preparam profissionais sem a menor condição. Nós temos hoje acesso à informação plena, o que não tínhamos há dez anos. As pessoas sabem muito mais dos seus direitos e buscam muito mais por eles. Então, são muitas as causas deste momento de judicialização plena que nós vivemos. Eu acho que o problema não é a judicialização, é não recebermos uma resposta para a sociedade num tempo razoável.
O senhor é favorável que parte da Justiça esteja fazendo o trabalho à distância?
Não sou favorável. Eu acho que o juiz tem que morar na Comarca e estar dentro do Foro, porque a Justiça, sobretudo seja o trabalho do advogado ou do magistrado, é um ato humano. Nós tivemos problemas com isso, inclusive eu fiz um desagravo público em relação a uma magistrada de Canoas, porque ela determinava que as partes e advogados estivessem presentes na sala de audiência e ela estava on-line. Isso é inaceitável. O juiz, sobretudo numa audiência de instrução, precisa ter o olho no olho para ver se a testemunha está falando a verdade. Então, é fundamental que o magistrado esteja lá, pois ele é um servidor público. Essa é a posição claríssima da Ordem para que os juízes, desembargadores e ministros estejam presenciais nas serventias, nos respectivos Tribunais e na Comarca.
Qual a importância de haver regras sobre o traje e a linguagem do advogado e do magistrado?
Nós temos na nossa Lei Federal 8906 fixada e na própria Lei Orgânica da Magistratura também, que não há hierarquia entre juízes, advogados e promotores e que nós todos, operadores do Direito, devemos guardar entre nós urbanidade e respeito, tanto na forma de se vestir, quanto no jeito de se comunicar. Tem que ser respeitosa e me parece que deve ser adequada a uma profissão que exige um certo formalismo. Eu acho que aquele episódio com uma magistrada, que pedia para a parte chamar-lhe de excelência, mostrou um absoluto despreparo. Ela demonstrou que não tem nenhum controle emocional e muita arrogância, caracterizando uma situação de abuso de autoridade.
É possível que haja convergência com as entidades do Direito, para fazer eventos correlatos e estabelecer esse processo de respeito?
Sim, temos mantido, ao longo da minha gestão, uma relação absolutamente franca, respeitosa, propositiva e construtiva com os Tribunais e com as Associações. Nos sentamos à mesa com a Associação dos Juízes e a Associação do Ministério Público, para tratarmos dos temas difíceis e espinhosos. Possuímos pontos de vista evidentemente diferentes e quando não convergimos buscamos os mecanismos legais que estão à nossa disposição para dirimir as divergências. Nós firmamos protocolos de intenções com a Brigada Militar, a Polícia Civil e o próprio Ministério Público. Pontualmente, nós vamos ter que fazer um desagravo público ou uma denúncia, ser mais duros em relação a uma violação de prerrogativa e defender a advogada e o advogado, mas sempre mantendo o respeito e o equilíbrio.
Quais são as suas considerações finais?
Eu sei que a advocacia vive um momento difícil, com as restrições ao nosso exercício profissional, mas a OAB/ RS está muito forte e unida. No que depender da Ordem gaúcha, todos os temas que sejam de interesse da advocacia e da sociedade, nós vamos enfrentar de forma equilibrada e respeitosa, mas com a mesma firmeza que tivemos na primeira gestão. Tivemos a aprovação na Comissão de Constituição e Justiça da Assembleia Legislativa do RS de um Projeto de Lei importantíssimo, que isenta o pagamento de custas nas execuções de honorários. Uma grande conquista legislativa da nossa gestão. Estamos projetando muitos outros programas e projetos de lei de interesse da advocacia. Então, o meu muito obrigado a todas as advogadas e advogados gaúchos e a sociedade, pelo carinho que me dispensou e o incentivo para nós continuarmos lutando. A OAB/RS tem um compromisso com a advocacia e a cidadania gaúcha. Portanto, vamos continuar trabalhando muito.





