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14/12/2020

O  ano de 2020 foi muito difícil em vários aspectos, mas para meninas e mulheres em situação de violência foi ainda mais cruel. Classificada, pela Organização das Nações Unidas (ONU), como a “pandemia sombria”, as diferentes formas de violência contra a mulher tiveram um aumento alarmante com mais agressões e menos denúncias. Diante deste cenário, a Comissão da Mulher Advogada (CMA) decidiu se engajar na campanha mundial “16 dias de Ativismo pelo Fim da Violência contra as Mulheres”, debatendo as diferentes formas de violência e destacando diversos aspectos relacionados ao tema. Ao todo, foram sete eventos online, duas lives no Instagram, além de publicações de conscientização nas redes sociais.

A CMA também lançou a Cartilha de Combate à Violência Doméstica e Familiar contra as Mulheres, trazendo informações sobre as diferentes formas de violência, os tipos de agressão, além de como procurar ajuda e denunciar.

A presidente da CMA, Claudia Sobreiro, destacou a qualidade de todo o conteúdo desenvolvido nos 16 dias de campanha: “Foram abordadas as mais variadas formas de violência contra a mulher, discutimos soluções, alternativas para redução dos casos. Essa conscientização precisa seguir e não encerrar nesses 16 dias. Vamos aproveitar todo esse conteúdo para seguirmos no enfrentamento tão necessário e condizente com a nossa realidade como mulheres advogadas”, reiterou.

Violência na internet

O primeiro evento online aconteceu no dia 26 de novembro e debateu misoginia e o machismo na internet e o como o trabalho pode ser um instrumento de combate à violência contra a mulher.

A palestrante Caroline Vasconcelos Damitz falou sobre a diferença entre o comportamento machista e a misoginia: “O machismo pressupõe um gênero superior ao outro, é um combinado de comportamentos naturalizados na nossa cultura, e a gente acaba por reproduzir até de forma inconscientemente. Homens e mulheres têm atos machistas. A misoginia, por sua vez, é a aversão, o ódio às mulheres. Uma conduta hostil, agressiva, com a intenção de causar um dano”, explicou.

Caroline falou sobre canais misóginos na deep web organizados para planejar ataques contra mulheres: “Esses canais espalham muito conteúdo misógino, fake news e são um mecanismo de intimidação. Hoje, há uma enorme dificuldade de regulamentação nesse campo, quem deve ser responsabilizado? Os provedores, as pessoas que compartilham, as pessoas que fazem downloads desses conteúdos? Temos ainda as questões, envolvendo território, o que vai ser considerado violência, a liberdade de expressão frente ao direito de privacidade, enfim, são questões muito complexas que estamos aprendendo a lidar conforme surgem”, avaliou.

Veja aqui alguns dos tipos de violência contra as mulheres praticados na internet.

Mercado de trabalho e o fortalecimento da mulher

Em seguida, a palestrante Luciana Aranalde falou sobre a importância da inserção da mulher no mercado de trabalho, tanto na prevenção, quanto no combate à violência doméstica. “As empresas precisam ter um olhar mais apurado e tentar identificar se há algo errado, alguma postura diferente. O trabalho, sem dúvidas, é algo que previne a violência, fortalece a mulher. As relações que se constroem no ambiente de trabalho, muitas vezes, podem representar a quebra do ciclo da violência”, ressaltou.

Luciana falou ainda sobre o artigo na Lei Maria da Penha, que determina que a mulher afastada do trabalho, por questões envolvendo a violência doméstica, não tenha seu contrato rescindindo pela empresa.

Racismo estrutural

No segundo evento online da série, o tema debatido foi o racismo estrutural. A advogada Bianca de Almeida Neves e a professora Patrícia da Silva Pereira fizeram um resgate histórico sobre a sociedade brasileira e o racismo estrutural.

“O racismo no nosso país vem se estruturando ao longo dos anos e está intimamente ligado ao processo de desigualdade social, político e econômico. Desde a marginalização dos negros, a hipersexualização das mulheres negras, o racismo institucional, enfim, as práticas, costumes e falas que se perpetuam ao longo do tempo”, reforçou Bianca.

Sobre a violência doméstica, a palestrante comentou o fato de as mulheres negras serem as principais vítimas: “Os dados estatísticos nos mostram que as mulheres pretas são as que mais sofrem violência doméstica. Muitas vezes, essa mulher está inserida em periferias, onde o poder público dificilmente tem acesso, ela é desprotegida pelo Estado”, argumentou.

A professora Patrícia trouxe uma palestra sobre a educação antirracista e um apanhado das leis escravagistas que, por anos, impediram o acesso da população negra à educação: “Só tivemos o acesso garantido com a Constituição de 1988, o que é muito recente para um país como o nosso e, somente em 2003, entrou em vigor a lei do ensino obrigatório nas escolas da história da África e dos povos indígenas do Brasil. Mas como efetivar essa educação? Precisamos vencer, dentro da escola, a estética da dominação. Podemos usar princesas negras das histórias, as princesas reais da África, os desenhos infantis, os reis africanos, as bonecas negras, os livros infantis. Tudo isso é fazer valer a lei, papel dos advogados, e que os professores também fazem nas escolas”, enfatizou.

Veja aqui exemplos de figuras negras pioneiras em diversas áreas.

Feminismo e o HIV

No dia 30 de novembro, a CMA abordou o feminismo e o HIV, trazendo para o debate o documentário Carta para Além dos Muros e o filme Fogo nas Veias. A palestrante Leilane Serratine Grubba ressaltou os dados sobre a transmissão de HIV por homens heterossexuais e a contaminação das mulheres. “Conforme o Ministério da Saúde, de 2007 a 2019, os homens heterossexuais foram responsáveis por mais de 58% dos novos casos de infecção de HIV. Isso nos mostra que quem continua se infectando e infectando suas mulheres são os homens heterossexuais. Sabemos que, no Brasil, 80% das mulheres soropositivas foram contaminadas pelos seus maridos. Logo, essa é uma causa feminista e dois fatores estão ligados a isso: a violência doméstica e sexual e a confiança no casamento, no parceiro fixo”, frisou.

Assédio

No dia 1º/12, o tema abordado foi o assédio. As advogadas Ana Paula Ávila e Pietra Gomes trouxeram a legislação a respeito, e casos práticos.

A especialista em compliance, Ana Paula, falou sobre a visão de prevenção do assédio e como a legislação afeta as empresas: “O assédio representa um risco muito grande para a empresa. A jurisprudência vem se firmando no entendimento da responsabilidade objetiva da empresa. Quando comprovado o assédio por parte do colaborador, a responsabilidade por danos morais se impõe de qualquer forma a empresa”, afirmou.

Ana Paula acrescentou ainda que “no Direito Penal o assédio sexual é crime, mas quando ocorre de forma vertical com a figura do assediador em posição hierárquica superior à da vítima, já no Direito do Trabalho, não há distinção hierárquica para se considerar uma vítima de assédio e não é necessária a reincidência da conduta para configurar o assédio. Tanto o assédio vertical, quanto o horizontal, vão ensejar na demissão por justa causa”.

Veja aqui o resultado de uma pesquisa realizada pela Associação Internacional dos Advogados com advogados e advogadas de 135 países, incluindo o Brasil, sobre assédio sexual e moral no ambiente de trabalho.

A palestrante Pietra ressaltou como a empresa pode estar atenta e coibir a prática do assédio: “No momento do ingresso, é preciso deixar claro para o trabalhador e para a trabalhadora que a empresa não admite nenhum tipo de ato discriminatório, de assédio moral ou sexual. Além disso, a empresa precisa desenvolver canais de escuta, fazer pesquisa de clima organizacional, os recursos humanos devem estar abertos a acolher as reclamações. Se isso não acontece, a reprodução do assédio pode se dar em larga escala, aumentar a rotatividade da empresa e tornar o ambiente hostil”, assegurou.

Veja aqui dois casos de jurisprudência comentados no evento.

Patriarcado e a violência contra a mulher

No dia 4 de dezembro, a palestrante Renata Almeida da Costa falou sobre o patriarcado e a violência contra as mulheres, fruto desse sistema: “Essa íntima relação entre a lógica do patriarcado, a prática da violência que pode ser, tanto física, real, quanto também simbólica, são a consequência de frustações, em boa medida, das expectativas dos papeis sociais”, concluiu.

Violência institucional – Caso Mariana Ferrer

As atividades da campanha encerraram na última quinta-feira (10), no Dia Internacional dos Direitos Humanos. Como último assunto abordado, a violência institucional foi debatida com o exemplo do caso de grande repercussão da modelo Mariana Ferrer. A palestrante da noite, Ana Claudia Bastos de Pinho, explanou sobre a tradição autoritária no sistema de justiça criminal. A promotora apontou a defasagem do Código Penal (1940) e do Código de Processo Penal (1941), ambos da época do Estado Novo de Getúlio Vargas, um período de ditadura. “No caso da Mariana Ferrer, podemos ver como o sistema machista da justiça criminal a define como uma mulher não estuprável. A mulher que pode ser vítima de estupro é a mãe de família, a boa esposa, a dona de casa, agora uma mulher que escolhe outro estilo de vida não pode ser a vítima”, reiterou.

Ana Claudia avaliou, ainda, a postura do juiz, do promotor e do defensor no caso: “Durante a audiência, Mariana foi colocada contra a parede o tempo todo, foi constrangida. O juiz em um ato falho, pergunta se ela confirma se será defendida pela defensoria pública, ora, ele poderia ter usado assistida, acompanhada, mas nunca defendida, pois ela era a vítima”, ressaltou.

Sobre as humilhações do advogado à vítima, Ana Claudia afirmou que ele cometeu crime de injúria: “Não interessa ao processo a humilhação, as injúrias que o advogado comete falando das fotos, de maneira ofensiva e que nada tinham a ver com o caso em si. A ampla defesa tem limites na dignidade da pessoa humana, limites para o exercício da defesa plena, não pode se converter em um ataque desarrazoado”, ratificou.

Participaram como mediadoras dos eventos as seguintes integrantes da CMA: Maiaja Freitas; Daniela de Matos; Maximilia Silva de Paula; Carolini Lima; Líbia Suzana da Silva; Laura Albrecht Freitas e Julia Pinto Loureiro.

As lives dos dias 03 e 08/12 podem ser assistidas no perfil da CMA no Instagram: @comissaodamulheradvogadaoabrs.

Os eventos dos dias 26, 27, 30/11, 01, 04 e 10/12 estão disponíveis no canal da OAB/RS no Youtube.

 
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